Desde que a Organização Mundial da Saúde
(OMS) anunciou a COVID-19 como pandemia, e que o distanciamento social foi
decretado, estamos recebendo diariamente uma enxurrada de lives e dicas
de "como combater a ociosidade" e da "necessidade de se
reinventar".
Vou lhe dizer: Calma! Respire e mantenha
em mente de que estamos vivendo uma pandemia e não uma maratona de
produtividade. Nossa saúde mental já vem pagando um preço bastante elevado
pelos rastros da COVID-19 e não precisamos definitivamente "nos aprontar"
mais está.
É um cenário de incertezas, e os relatos
de ansiedade e angústias mais afloradas, e noites mal dormidas se tornam cada
vez mais frequentes, tanto na escuta clínica quanto nas "rodas"
(mesmo que virtuais) de conversas. Então por que exigir de si mesmo que chegue
ao final da pandemia com uma pilha gigantesca de livros lidos e um aumento
significativo de novos cursos realizados? Porque exigir de si mesmo a tal
"reinvenção"?
Sim, podemos aproveitar esse período para
colocar leituras em dia e fazer aquele curso que há muito vínhamos adiando. Mas
não precisamos (e não devemos) fazer disso uma obrigatoriedade! Tenho visto
pessoas se cobrando de tal forma, que passam a sofrer por não dar conta de
assistir todas as lives, concluir todos os cursos e por não terem lido
2, 3 ou 4 livros desde que a pandemia nos colocou em casa.
Da mesma forma tenho acompanhado pessoas
sofrendo por não sentirem a necessidade de se reinventar como vem sendo pregado
por aí, ou porque simplesmente não conseguem ver formas de fazer isso neste
momento. E aqui é importante ressaltar que existem pessoas que estão sempre em
busca de formas de se reinventar, seja pessoal ou profissionalmente. Muitas
delas porque encaram isso como uma ferramenta de crescimento e desenvolvimento,
é o que as motiva e as faz crescer. Outras porque evitam, mesmo que
inconscientemente, se haverem com coisas que são suas e buscam no
"reinventar-se" uma forma de fuga. Assim como existem as pessoas que
não sentem necessidade alguma de se reinventar, igualmente poque negam, mesmo
que de modo inconsciente, as coisas que lhes cabe e sua responsabilidade no
caos que vivem. Ou ainda por estarem "bem resolvidas" com suas
questões e terem se organizado de tal forma que a reinvenção não se faz
necessária para que sigam suas vidas de modo satisfatório.
A grande questão nisso tudo é perceber (e
respeitar) o seu tempo e as suas necessidades.
Se você conseguir fazer de forma tranquila
e proveitosa um curso que vinha adiando, ou se conseguir colocar em dia as
leituras que vinham atrasadas, maravilha! Mas que isso seja prazeroso para você
e seja para agregar em seu desenvolvimento, mas não para lhe causar ainda mais
desconforto, e muito menos para mostrar aos outros como você foi produtivo
durante a pandemia (como se isso fosse uma disputa para ver quem chegou na
frente).
Da mesma forma a questão do
"reinventar-se". A freada brusca que a pandemia ocasionou no ritmo em
que vínhamos vivendo colocou muitas pessoas de frente consigo mesmas, e isso
pode ser positivo mas por outro lado pode gerar grande desconforto. A
maior parte de nós não foi educada para olhar para si, não somos habituados a
isso. Além disso, falar e/ou cuidar da saúde mental ainda é tabu na sociedade
em que vivemos, o que dificulta ainda mais esse processo. Assim, quando o tempo
"sobra" e nos vemos reclusos, sem poder seguir nossa rotina da forma
como vínhamos seguindo normalmente, a angústia de olhar para si transborda.
Muitas de nossas questões, antes "seguras e bem guardadinhas" afloram
e exigem de nós um olhar diferente. Reinventar-se pode ser necessário para
muitas pessoas neste momento, uma vez que nossas relações de trabalho vêm sendo
diretamente impactadas pela pandemia, e até mesmo porque nossas relações com as
pessoas estão sendo afetadas (e não sabemos por quanto tempo serão desta
forma). O que não podemos é encarar isso como uma regra. Se fizer sentido para
você, perfeito! Aproveite este tempo para revisitar seus gostos, seus projetos
e conhecer um pouco mais sobre você... autoconhecimento muitas vezes abre
possibilidades que jamais imaginaríamos. Mas se não faz sentido para você,
independente do motivo, ou porque simplesmente não vem conseguindo pensar sobre
isso em meio ao caos da pandemia, perfeito também! Respire e não se culpe.
Não vai existir uma receita pronta ou um
manual de instruções perfeito de como enfrentar a pandemia, mas certamente
cuidar da saúde mental vai fazer a diferença! Filtre e limite o tempo exposto a
notícias, cuide da higiene e da saúde física, procure criar uma rotina (mesmo
que temporária), mantenha-se "junto" de seus familiares e/ou amigos
aproveitando os recursos do mundo digital, se puder fique em casa. E não
esqueça: respire, não se culpe, não se cobre tanto, e se puder busque ajuda de
um profissional para lhe ajudar nos cuidados com sua saúde mental.
Mantenha em mente que estamos enfrentando
uma pandemia, e não disputando uma maratona de produtividade. E que sua saúde
emocional precisa (e merece) cuidados, tanto quanto sua saúde física!
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