Era março de 2020, os primeiros casos da COVID-19 no Brasil já haviam deixado de ser isolados. Acordávamos de uma forma e íamos dormir com novo decreto e com novas orientações quase que diariamente. Faltava álcool 70% nos supermercados e farmácias. Cada saída de casa virava um ritual, regado a medo (que beirava pavor muitas vezes) e a uma ação de guerra na volta para ter certeza de absolutamente tudo e cada pedaço nosso estava "limpo", e livre da ameaça. Aprendemos que aqueles ensinamentos lá da infância de lavar as mãos com frequência eram muito mais importantes do que imaginávamos.
Perdemos o chão, ficamos sem rotina, e nos vimos obrigados a inventar novas formas de trabalhar, estudar, ver os que amávamos. Quarentena, lockdown, home office, distanciamento... palavras que foram ganhando cada vez mais espaço em nossos diálogos. Aprendemos que aquela rotina que antes era motivo de reclamação na verdade era parte do que éramos.
Veio a Páscoa, o dia das mães, os aniversários... a saudade e o vazio preenchiam datas que antes eram recheadas de abraços apertados e sorrisos. Aprendemos que amar mais do que nunca virava sinônimo de proteger.
As demissões, as empresas fechando, sonhos eram ceifados. Os transtornos de ansiedade que já eram alarmantes no Brasil começaram a disparar, as pessoas chegavam desesperadas e sem chão nos consultórios (que neste momento já eram também virtuais). Aprendemos aos pouquinhos que nossas emoções também precisam de cuidados.
Os cientistas do mundo todo se uniam na busca pela cura... vacina, tratamento, qualquer coisa que nos desse esperança. Aprendemos que algumas coisas eram de fato eficazes e outras nem tanto assim, e que toda vacina chega com sabor de vida.
Fomos para as janelas e varandas bater palmas e piscar as luzes como forma de sinalizar nossa gratidão aos heróis da saúde que lutavam por nós na linha de frente nos hospitais. Aprendemos a sorrir com os olhos, por de trás das máscaras que viraram artigo de sobrevivência.
2020 corria e nossa esperança era alicerçada no desejo de que ele acabasse, e com ele levasse toda dor, medo e angústia que nos acompanhava. Aprendemos a valorizar o tempo, a vida e cada momento simples ao lado de quem amamos.
Eis que 2020 acabou, o carnaval passou e já é março outra vez... e agora? A COVID-19 segue conosco, ceifando vidas, assombrando sonhos, ameaçando.
Pessoas relatam sentir como se estivem vivendo um dejá vu, como se estivessem sendo ameaçadas por um monstro sem rosto que rodeia suas casas e está cada vez mais perto. Já é evidente que a pandemia trouxe adoecimento emocional como avalanche.
Vivemos um luto que parece não mais ter fim.
Luto por cada vida perdida, já que sabemos que cada número que chega noticiando as mortes, nos traz a dor de famílias que tem um pedaço de si arrancado.
Luto pela nossa vida que segue ameaçada e restrita.
Luto pela parcela da população que segue fazendo de conta que nada está acontecendo.
Luto pela outra parcela de pessoas que segue agindo por interesses pessoais e fazendo de uma pandemia, uma batalha política.
Luto por aqueles que esquecem que o momento deveria ser de união... de sermos nós (humanos) contra o vírus, e não essa batalha de extremismos na qual muitos vem se posicionando.
Queria estar aqui escrevendo à você que me lê contando isso como algo que aconteceu há muitos anos e hoje é só lembrança. Mas infelizmente, lhe escrevo de março de 2021, acompanhando notícias de uma pandemia que não cede e de um vírus não se despediu na virada de ano.
Hoje lhe escrevo na tentativa de confortar seu coração e o meu também. Lhe escrevo para dizer que não desanime e não perca a esperança, pois não está lutando sozinha ou sozinho, eu estou com você e com nós tem milhares de outras pessoas. Então sim... não temos a certeza da data, mas nós vamos vencer a COVID-19.
Lhe escrevo para pedir que não se culpe por estar com sentimentos tão confusos, que vão do riso as lágrimas, da tranquilidade à uma raiva quase que incontrolável, de uma segurança tremenda que se transforma em medo e incerteza segundos depois... esse turbilhão de emoções é esperado considerando que há um ano vivemos o turbilhão mais intenso de nossas vidas.
Lhe escrevo para dizer que não existe receita pronta, mas certamente ser gentil com você e com seus sentimentos, vai fazer a diferença.
Lhe escrevo pedir que siga... não importa a velocidade, mas siga. Traga o que puder consigo, se permita (mesmo que seja com limitações para lhe manter segura). Não sou adepta da expressão "novo normal", prefiro acreditar e defender adaptação... vamos trazer o que for possível do nosso normal e adaptar para viver com segurança o momento difícil que estamos enfrentando. Vamos nos reinventar, vamos lutar, e vamos vencer.
E por fim escrevo para lhe convidar à pensar em tudo o que aprendemos com a COVID-19 e sobre a COVID-19 neste período. Que estes aprendizados sejam alimento também para manter a esperança em cada um de nós.
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